quarta-feira, 23 de maio de 2012

Advogado: almofadinha ou casca-grossa?

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A língua portuguesa sempre foi permeada por expressões cheias de conteúdo, mas, as que mais chamam a atenção são aquelas que, essencialmente, sendo nomes próprios revelam um estilo de ser, um estado de espírito... 

Veja-se o exemplo do Ricardão. É aquele que neste exato momento pode estar papando a mulher do próximo. Ou o Robert, bicão dos bons e que surge nos momentos menos oportunos. Ou o Mauricinho, aquele ajeitadinho, filhinho de papai, um metro ou über-sexual. De acordo com este último conceito, homens que usam cremes, roupas e acessórios femininos, se depilam e fazem as unhas não estão mais na moda. A nova corrente se aproxima de homens que encarnam uma imagem muito mas clássica. Em termos coloquiais, "Über" significa "acima" em alemão, e seu equivalente em inglês seria "super".

No entanto, os autores não mencionam uma intensa atividade sexual do "übersexual", mas a recuperação de uma certa masculinidade que, na sua opinião dos escritores, se perdera nos últimos anos. Assim, o "übersexual" será aquele que confia em si mesmo sem se tornar detestável, tem um aspecto masculino, possui estilo e está determinado a alcançar os mais altos níveis de qualidade em todas as áreas de sua vida.

A expressão almofadinha virou sinônimo de frescura, excesso de arrumação e vem lá dos tempos mais remotos, na época em que ainda se andava de bonde... Como os bancos dos bondes eram de madeira, alguns levavam sua almofadinha para ter uma viagem mais confortável. No final das contas, o almofadinha passou a ser considerado aquele que em geral é meio adamado ou extremamente bem-vestido e preocupado com a aparência; alguns dicionaristas mais antigos definem o almofadinha como “casquilho", “salta-pocinhas”, “janota" e “peralvilho". 

E, diante de tantas definições, fico aqui conjecturando se é verdade que para um cara ser bom advogado deve ser almofadinha... aliás é um karma que a profissão carrega. Será que o advogado bem sucedido deve ser almofadinha, ou pelo menos – nos tempos mais modernos - um metro ou über-sexual. Ou será que o advogado deve ter como ídolo Átila, o Huno? 

Será que quando um advogado é selecionado para algum cargo ou função é importante saber se dorme de pijama do Mickey Mouse; anda sempre com cabelinho arrumado; tem carro importado alemão; fica se olhando no espelho ou nas janelas dos carros; faz a barba com um Philishave Super Pro para peles sensíveis; sempre apara os pentelhos para que não enrosquem na cueca; sabe combinar perfeitamente um terno e uma gravata sem precisar de ajuda feminina; ou no restaurante diz "com licença, vou ao toilet"???? 

Engraçado que muitas vezes o conhecimento jurídico é relevado a segundo plano. Vejo muitos colegas que se preocupam demasiadamente com a aparência e o show-of e isto, necessariamente, não significa competência. 

Por outro lado, não faço aqui a apologia ao advogado brucutú, que, quando acorda dá só uma ajeitada com a mão no cabelo e deixa-o assim o resto do dia; que quando passa uma mulher do lado, ele dá uma olhada ao seu derrière; não sabe nem dar um nó na gravata; ou no restaurante anuncia que “vai dar um mijão”... 

Escrevo o post especialmente destinado àqueles que ainda pensam que as aparências enganam. O cara, para advogar, deve ser bom, ter conteúdo, conhecer o direito, afinal, não se consegue enganar todos a todo o tempo. Conteúdo é a palavra do momento. 

Nada impede que na busca ao conhecimento tenha cultura, bons modos e gostos refinados, estes absolutamente compatíveis com o exercício da advocacia, mas não precisa ser perfeito, como se saído de uma revista de moda ou de ricos e famosos. O advogado não precisa ser um personagem tipo o Spartacus do Discovery Channel ou o Sr. Hart do "Casal 20"!!! 

O advogado pode gostar de assistir filmes do Woody Allen a “Árnoudi Xuarzenégui”; limpar a boca no guardanapo de dupla face ultra macio ou na toalha; usar papel higiênico Personal folha dupla com perfume de camomila ou na hora do aperto ir de jornal mesmo; apenas faço questão de salientar aos que pensam que uma gravata Hermés, um relógio Breguét ou um sapato Church’s fazem verão, que estão redondamente enganados. O mis-em-scène pode ser até importante, mas não substitui a alma, o conhecimento, o amor pela luta, pelo Direito e pela Justiça. Fica o meu alerta. Almofadinha, casca-grossa, metro ou über-sexual devem ter estofo, não apenas ser advogados, mas devem estar advogados, balizando-se por princípios fundamentais que valorizam o estado democrático de direito e o nobre exercício da profissão. 

Cito para tanto o Decágolo do Advogado citado pelo Professor Uruguaio Eduardo J. Couture no ano de 1949 na Cidade de Buenos Aires. 

O autor foi muito feliz em dizer que o direito se transforma constantemente. Se o advogado não seguir os passos dessa evolução, será cada dia um pouco menos advogado; o direito também se aprende estudando, observando e ouvindo mas se exerce pensando; portanto estudar, pensar, observar e ouvir é essencial.

A advocacia é uma área de fadiga posta a serviço da Justiça e o dever do advogado é lutar pelo Direito. Mas, se houver conflito entre o Direito e a Justiça, deve o advogado lutar pela Justiça.

A lealdade é imperiosa no exercício da profissão. O advogado deve ser leal com seu cliente e parceiros, a quem não deve abandonar até que compreenda que é indigno para o exercício das tarefas. Ter também lealdade com o adversário, ainda mesmo que ele seja desleal, lealdade para com o juíz, que ignora os fatos e deve confiar no que diz o advogado e que, quanto ao direito, vez por outra, deve confiar no que o profissional lhe invoca.

O advogado deve tolerar a verdade alheia na mesma medida em que seja tolerada a sua, da mesma forma que deve ser paciente, já que o tempo se vinga das coisas que se fazem sem vagar, calma e porque não dizer: paciência. 

Outrossim, o advogado deve ter fé, como o melhor instrumento para a convivência humana; na justiça, como destino normal do direito; na paz, como substituto da justiça; e, sobretudo, ter fé na liberdade sem a qual não há direito, nem justiça, nem paz; é a melhor rota para a felicidade na profissão.

A advocacia é uma luta de paixões. Se, a cada batalha, o advogado for enchendo a alma de rancor, chegará um dia em que a vida tornar-se-á impossível. Terminado o combate, o bom advogado, pelo bem de sua saúde, sanidade e espírito, logo esquece a vitória, assim como a derrota.

Finalmente deve-se amar a advocacia, de tal maneira que, no dia em que teu filho lhe peça conselho sobre o seu destino, consideres uma honra para ti, propor-lhe que se torne advogado... 

Que valham os conselhos para todos, dos almofadinhas aos cascas-grossa, mas que tenham sempre em mente que no deserto da advocacia, quando se encontra um cacto, por mais espinhoso que seja, no seu interior pode haver água para saciar a sede.



(Mauricio Scheinman -  Advogado e  Professor de Direito Comercial/Empresarial  PUC/SP)
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Um comentário:

  1. Oi para ser um bom advogado tem que gostar do que faz.e estudar muito.ter bom carater,muito boa esta materia.

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